TAMBÉM SOU OITO
MARCELO NOVAES
Para minha surpresa - e para surpresa
minha -, ele não me dirige sequer palavra
quando nos sentamos frente à frente. Olha-me
nos olhos e mimetiza várias de minhas faces
- aquelas duzentas e doze -, e muitas das
posturas que acompanham as linhas
que trago no rosto: as linhas que
costurei para mim mesmo.
Para minha surpresa - e para surpresa
minha -, ali estão elas: bem mimetizadas
e sucintas, agora transtornadas em sua face
mais branda. E o que eu experimento já não
é surpresa, mas uma espécie distinta e ilesa
de curiosidade. E pequenas reações posturais
acompanham minhas reações mais íntimas
ao me ver tão bem descrito e moldado no
rosto que não sou eu mesmo.
E eu me atrevo a algum movimento, sem
peso. Logo me sou devolvido ao corpo fixo.
Se tenho pressa e me inclino - por exemplo -,
ele me toca no ombro direito, na hora mesma
em que intento mover-me daquele jeito. Sem
nada dizer nem dizer nada, seu rosto expressa:
“sei como tu és e como reages a você; desde
lá atrás, eu te sei”.
Sim, sabe. Porque o faz de forma contínua,
sem sequer pronunciar sílaba que seja. O tempo
parece se distender pra trás pra frente pra dentro,
fazendo-me presente e presentificado no ambiente,
e ao mesmo tempo projetado em tela grande atrás
dele - de plasma -, do tamanho de um estádio de
rugby.
Para surpresa minha - e pra minha surpresa -,
levanto-me, ancorado, sem sair da esteira - nem
ele do estrado -, e sigo ao mesmo tempo a oito
direções da estrada rarefeita - enquanto me vejo
em tela plana de plasma, compreendendo a razão
e o significado de cada gesto mínimo meu. Feixe
de sentimentos são ossos, músculos, ângulos de
passos: rápidos, lentos. Lentos, rápidos.
Chego num octógono, num teatro de arena
com oito faces - com oito lados -, e me ponho
no centro: também sou oito. Adolescentes me
entrevistam e me propõem aforismos e laços,
e que eu saia dos transes hipnóticos que
guardaram meus sopros nessa caixa de
músculos e ossos em que me mostro
ao mundo.
Sou oito. E lhes entrego uma súmula de
conteúdos com gestos autênticos.Novos.
Decifro-lhes os aforismos como certezas
e belezas presentes em mim mesmo.
Suas idades somadas recaem sempre
em oito. Também sou oito. Todos temos
a nossa quota de gesto e espelho, na vida.
Nada para correr atrás. Nem apressar a
saída deste Teatro de Arena.
quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009
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3 comentários:
Que beleza de poema, não é, Wellington! Adoro ler Marcelo Novaes, tenho uma prateleira lotada dos poemas que imprimo, mas é tão bom quando é você que escolhe. Parece que tem outro sabor!
Tem um desafio para você no meu blog. Se não quiser, não precisa fazer, mas eu gostaria. Precisa ver como o nosso Recife ficou pobre...pobre na minha postagem.
Beijos
Mirze
Hummm...
Gostei desse meu poema aqui.
Com fundo branco. Tudo luimpo. Clean.
Muito elegante.
Obrigado, Wellington!
Abração,
Marcelo.
MARCELO,
ESSE É UM DAQUELES QUE ME FUGIAM, SEM QUERER ACHEI-O. E É LINDO!
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