terça-feira, 22 de julho de 2008

DE TUDO RESTA UM POUCO.


Continuando a minha autobiografia (como disse Shakespeare, “as grandes tragédias vem aos borbotões), quem diz isso é o rei assassino do pai do príncipe. Mas continuando a minha biografia que fez um retumbante sucesso na internet (comparativamente é o seguimento que mais cresceu na NET em todo mundo), um mês atrás só havia uma pessoa que viesse a esse blog, nem eu vinha, passava meses sem postar nada (o que naturalmente causou perdas irreparáveis a humanidade), hoje tenho três pessoas que comentam minhas geniais postagens, Marcelo Novaes (cujo comentário supera e muito o que é escrito por mim), Mirze (um amor de pessoa)e eu. Como que eu não conto? Eu não sou um ser humano?
300%, em um mês! Fosse a bolsa de valores meu blog, hoje estaria eu remediado, e os outros dois não sei (falo financeiramente). Digo remediado, porque para tornar o que tenho uma fortuna, seria preciso não 300%, mais 3000%.
Estou perdendo o foco, claro que isso nunca acontece, quando comento os poemas de Marcelo, por exemplo, eu falo de tudo, menos do que está escrito no poema.
Mas vamos a minha vida hodierna (palavra pedante, aliás, a própria palavra pedante é muito cheia de si), sei que se a rainha Gertrudes (mulher frívola!) estivesse aqui diria: menos arte polônio, mais fatos.), como não sou polônio, nem privo de intimidades de rainha alguma, vou adiante.
Hoje em dia, com 33 anos, recém completados, frise-se, eu fico um pouco chateado por ter tido tanto tempo e não ter feito tanto nada. Mas por outro lado, pensando bem, olhando direitinho, eu fiz sim, fiz muito. Não é cabotinagem não, mas quando olho meu filho, sua pele branca que parece um pêssego, seus olhos azuis, suas coxinhas lindas, seu bumbunzinho gorducho, sua voz linda me chamando: paínho!
Bom, eu quero saber em que meu filho é inferior à capela sistina? não é corujice não, eu sou um pai muito racional, se tomo partido de meu neném é porque ele sempre está certo, fazer o que?
A capela sistina tem lá seu charme e sua beleza, mas ela não vai sair de Roma e me dar um beijo, e se fosse possível ainda assim eu preferiria o de meu bebe, lindo!
Fiz esse texto para falar de Drummond, posto aqui um poema dele que me arrancou lágrimas hoje pela manhã, eu já conhecia o poema, mas hoje ao reler o tal, chorei. Drummond era sim um grande poeta, não o maior, mas um dos grandes, como João não é o maior, é um dos grandes.
O cara que escreve uma coisa como essas é amado por mim, qualquer pai que venera o filho tem meu apreço. Meu filho é tudo, a única coisa que me redime e me justifica, minha autobiografia é essa: Luiz Xavier Guimarães, o pitocudo branco, o rei dos pitocudos brancos. Amado, adorado hoje e até o dia em que tudo o mais for silêncio.
Segue o poema de Drummond, que me arrancou lágrimas hoje pela manhã.


De tudo ficou um pouco
Do meu medo. Do teu asco.
Dos gritos gagos.
Da rosa ficou um pouco.
Ficou um pouco de luz
captada no chapéu.
Nos olhos do rufião
de ternura ficou um pouco
(muito pouco).
Pouco ficou deste pó
de que teu branco sapato se cobriu.
Ficaram poucas roupas,
poucos véus rotos pouco,
pouco, muito pouco.
Mas de tudo fica um pouco.
Da ponte bombardeada,
de duas folhas de grama,
do maço ? vazio ? de cigarros,
ficou um pouco. Pois de tudo fica um pouco.
Fica um pouco de teu queixo
no queixo de tua filha.
De teu áspero silêncio um pouco ficou,
um pouco nos muros zangados,
nas folhas, mudas, que sobem.
Ficou um pouco de tudo
no pires de porcelana,
dragão partido, flor branca,
ficou um pouco de ruga
na vossa testa, retrato.
Carlos Drummond De Andrade

Um comentário:

Marcelo Novaes disse...

Olá, Wellington!

Acho que viver sendo útil a alguns e não atrapalhando / prejudicando a ninguém, já é grande coisa. E sua biografia narrativa teve uma continuidade à altura do que já havia sido comentado. Seu amor pelo seu filho é notório, e uma obra de arte. Aliás,todas as relações de amor são obras de arte. E quanto a esse poema de Drummond, eu te digo o seguinte: é um poema de altíssima qualidade. Um cara que escrevesse algumas dezenas desses ( e ele escreveu) já merece o título de grande escritor, "refugos" ou "cascalhos" à parte. Se em quilos de terra se garimpa umas cinquenta pepitas dessas, já vale o título. Aqui, nesse poema, o que nós temos é um "coloquialismo brilhante". Um falso coloquialismo que é de uma riqueza de imagens e de construção que só quem sabe escrever muuuuito consegue, fazendo parecer "quase uma crônica". Eis uma das chaves para se pensar Drummond. Eu tiro o chapéu pra ambos ( "bater cabeça" você sabe que não...), Cabral e Drummond. e eu te garanto uma coisa, Wellington. Se você tiver paciência e pesquisar, vai achar algumas dezenas de poemas drummondianos desse calibre. Tendo sido um desses caras que preencheram os requisitos de fazer bem a alguns, e não prejudicar a ninguém ( falo de dolo, não de "eventual prejuízo indireto"), e deixando atrás de si uns cinquenta poemas como este, o cara merece o lugar que ocupa.Eu acho que desbancar o cara de um posto de idolatria média, por parte de um articulista de revista, faz parte até do charme dele. "Faz parte do seu show". Eu já o vi falar que Tolstói e Dostoiévski "são livros para a adolescência, porque ele os leu na adolescência, é nesse contexto que os vê". Bom, que ele os tenha lido, beleza. Ele ouvia Pink Floyd, Gênesis e Yes na adolescência, eu também, além de Tom Jobim ( gênio absoluto), Gil, João Bosco, Beto Guedes, Milton, Flávio Venturini, Ivan Lins. Mas poderia revê-los com olhar adulto. Ou não? Talvez por ler cedo demais, haja o risco de se ter aquele olhar desdenhoso da adolescência de se imaginar "já saber de tudo"...O exagero pode ser interessante, aquela iconoclastia que derruba lugares-comuns. Mas há que se reconhecer escalas de talentos, e não decepar as cabeças de autores em nome do efeito retórico que isso possa causar.

Abração,




Marcelo.